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segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

LIDERANÇA & MOTIVAÇÃO





Há um erro clássico, e que ainda persiste em Instituições Públicas, quando o assunto é motivação de colaboradores, que são os ainda chamados por alguns de “treinamentos motivacionais ou comportamentais”. Mas, por que é um erro clássico? Porque durante muito tempo se insistiu em motivar as pessoas por meio desses eventos. Em certa medida, buscava-se um despertar motivacional, sem para isso averiguar as bases estruturais da própria organização, necessárias a esse despertar, assim como as bases estruturais dessas pessoas para de fato se motivarem.

Ora, o processo de motivação é um processo intrínseco, ou seja, que é inerente ao ser. Ele depende de elaborações mentais próprias do indivíduo e não pode ser plantado a partir do exterior, no indivíduo adulto. Mas então, o que se pode fazer? Podem-se controlar as varáveis externas, que possibilitem essa manifestação motivacional, que é inerente ao desejo do indivíduo, e partir disso produza seus efeitos no meio.

Ao analisarmos a abordagem da hierarquia das necessidades de Maslow, que foi explicitada didaticamente pelo autor, é possível verificar o quanto o ambiente precisa produzir em termos de condições (fisiológicas, segurança e pertencimento) para que surjam as possibilidades motivacionais superiores, ligadas a uma realização do indivíduo. Isso fica bem claro na continuidade da abordagem elaborada por Herzberg, quando divide as necessidades em estímulos higiênicos e estímulos motivadores.

Então, durante muito tempo tentou-se, na melhor das hipóteses, despertar algo nos servidores públicos, em detrimento das condições necessárias para esse despertar. Quanto a isso, certa feita, em um curso de especialização, ouviu-se de um Mestre/doutor em abordagem psicanalítica a seguinte colocação: “Enquanto instrumento de saúde mental, a psicanálise é um instrumento que não se presta para qualquer dor, e também é um instrumento elitizado sim, e há uma razão social para isso. As pessoas comuns, as pessoas do povo, estão às voltas com necessidades básicas, e não têm tempo ou disponibilidade para as necessidades da alma!” A partir disso, pode-se entender o quanto é necessário resolver questões básicas e fundamentais para, posteriormente, poder se pensar em autorrealização. Isso também nos remete ao flagelo da educação pública, pois não é à toa que as faltas básicas dos meninos e meninas do povo tanto interferem, e de diversas formas, no processo educacional, provocando esse cenário fictício, no qual se tornou a formação educacional pública em nosso país.

Mas, enfim, voltando ao tema da motivação dos servidores públicos, o que pode contribuir para uma autorrealização? Inicialmente, é preciso satisfazer essas necessidades básicas que, se pensarmos em termos das relações perversas que campeam nossas instituições públicas, já se tem um grande problema a ser resolvido. Outra questão é a necessidade de despertar nos servidores o entendimento da importância de seu trabalho, público, e vincular seus desejos a este objeto, a questão do bem-estar social. Em outras palavras é preciso analisar e trabalhar com perfis adequados. E isso é condição sine qua non para a motivação para o trabalho.

O que é possível fazer? Hoje, a gestão por competências (Decreto 5.707/2006) é uma luz, e que pode contribuir para a construção de uma carreira profissional para os servidores. Alguns setores da administração pública já avançaram bastante, sobretudo no campo da gestão tecnológica, e nesse sentido o futuro promete, mas a estrutura de poder, da forma como se apresenta, não está preparada para motivar ou liderar pessoas, transformando esses servidores em profissionais da coisa pública. Isso, em se tratando das formas mais, por assim dizer, progressistas de gestão e gerenciamento, extremamente difundidas no meio, e em muitos casos, não devidamente adaptadas.

Esse despreparo para a gestão das pessoas, pode estar relacionado a uma dificuldade pessoal de se relacionar, ao exercer uma posição de mando, ou mesmo de burilamento no entendimento da questão humana. Certa vez, um determinado gestor perguntou a um educador da área de gestão de pessoas qual seria o segredo para gerir uma equipe. Quis saber ainda quem, de fato, teria a responsabilidade sobre o sucesso da mesma. Uma pergunta complicada? Talvez não. Pensemos em uma orquestra, onde todos tem competência em suas singularidades, mas precisam seguir a batuta do maestro, que dita ritmo e o andamento. Ora, quem dita ritmo e o andamento é sempre o maestro, diante da diversidade de instrumentos à sua frente. Mas, por que isso? Não é porque aquela diversidade o vê como Manda-Chuva, mas porque ele é o líder, ele tem a competência para tal, demonstrada em sua batuta, e por isso é respeitado e seguido. Todos, então, participam harmonicamente, seguindo o líder que se faz respeitar como tal, para que possamos nos maravilhar com o resultado daquele trabalho, um produto de qualidade para encantar nossos ouvidos.

Então, o grupo é e sempre será uma diversidade que pode ser transformada em uma equipe, e ao líder cabe ditar o seu ritmo e o andamento, com seu exemplo, seu estímulo e a observação de suas necessidades e movimentos. Não há como escapar disso, isso está inscrito na estruturação psíquica do indivíduo. Como fazer isso? Como fazer uma gestão estratégica de pessoas adequada, onde as pessoas sejam respeitadas, vistas fenômenos da motivação, e se tenha desejo por desenvolvê-las para o trabalho. Para fazer isso, não é só querer, é preciso ser.

Observações realizadas na conduta de alguns gestores sugerem certas distorções em relação ao exercício dessa função administrativa. Atitudes incompatíveis com as funções exercidas requerem uma análise mais apurada da situação, havendo diversas questões a considerar, inclusive em relação à própria motivação desses pretensos gestores, para agirem como tal.

Distorções em relação à conduta do gestor pode gerar, numa equipe de trabalho, um desconforto em relação à autoridade dentro de uma Unidade de trabalho. O gestor precisa se conscientizar de que seu trabalho é de gestão, e não apenas de processos, mas também de pessoas. Para tanto, é preciso usar as ferramentas necessárias e disponíveis para isso. Um gestor precisa se reconhecer como tal, e isso implica em reconhecer o próprio perfil e sua motivação.  Caso perfil e motivação estejam mais vinculados a um fazer operacional, o gestor precisa pensar nas possibilidades de desenvolver habilidades e atitudes compatíveis, caso contrário tenderá a agir sempre como um líder autoritário ou como um líder “laisser-faire”. Ambas as situações, que podem compor um perfil, de acordo com a demanda e a necessidade, quando se tornam em característica dominante, certamente, influenciará negativamente a motivação.

        Ao gestor de pessoas reserva-se a incumbência de ser um desenvolvedor de pessoas, um “coaching” para usar um termo da modernidade administrativa. Analisemos um caso real de Planejamento de Gestão de Equipe, para exemplificar essa necessidade do gestor construir estratégias de desenvolvimento para as pessoas.


Planejamento de Gestão de Equipe

Um dos elementos mais importantes para a construção de uma equipe de trabalho é, sem nenhuma sombra de dúvidas, a análise e o desenvolvimento do perfil profissional de seus componentes. Deve-se levar em consideração, nesse desenvolvimento, a construção de uma identidade e de uma relação de objeto com a missão e os valores da equipe.

Na construção da identidade profissional do servidor é necessário ao gestor, atuar como educador e facilitador do processo de aprendizagem e crescimento dos componentes de sua equipe. Tal aprendizado, em se tratando de um processo educacional envolve muito mais elementos do que o aprendizado e o treinamento relacionado unicamente aos processos de trabalho.

Portanto, no planejamento de gestão de uma equipe de trabalho é necessário, como passo inicial, envolver os componentes da equipe na construção de sua missão e de seus valores. Evidentemente, tal construção passa pelo entendimento dos objetivos e da função que a organização pública exerce para a sociedade. Esse primeiro passo dará o suporte necessário e possibilitará a construção dessa identidade profissional, vinculado-a por identificação à missão da organização. E isso é apenas uma possibilidade.

Um próximo passo, e também de importância vital, é o envolvimento da equipe na construção de seus fluxos e rotinas de processos de trabalho, para familiarização com uma metodologia de gestão de processos. A importância desse momento, além de organizar os fluxos e as rotinas de trabalho, é o desenvolvimento da percepção e da visão de processo, desde sua entrada até sua saída enquanto produto. E assim, os servidores poderão perceber a importância de seu próprio trabalho e a relação sinérgica necessária à equipe na realização de um ato social e de cidadania.

O passo seguinte nessa construção, e neste momento já se pensando em posicionamentos adequados de seus componentes, é a recolocação dessas identidades de acordo com suas aptidões e habilidades. Para tanto, é necessário um conhecimento mais apurado dos diversos perfis que compõem a equipe de trabalho, e o ajuste necessário ao ambiente, e que facilitará os fluxos e as rotinas dos processos.

Assim, concomitantemente ao desenvolvimento dos componentes da equipe, é necessário interferir no meio. Como este é um processo dinâmico, não se pode atribuir a esta ação uma hierarquia, em relação aos passos acima referidos. É preciso adequar o ambiente com vistas a facilitar o fluxo dos processos, seguindo a lógica da gestão de processos, ou seja, o ambiente deve refletir a entrada, o tramitar e a saída do produto.

É preciso ainda construir ferramenta de gestão para esses processos de trabalho. Tal ferramenta deve propiciar: a transparência, a análise das variáveis de interferência, as ações realizadas e realizáveis, relatórios para análise, e assim como a participação integrada de toda a equipe. Em suma, uma ferramenta possibilitará a gestão dos processos e a gestão participativa em uma Unidade de trabalho.

Na implantação de um plano de gestão é preciso levar em consideração a cultura, o comportamento e o clima organizacionais. Um planejamento de gestão de pessoas, que leve em consideração os fatores citados, além das características necessárias à liderança e à motivação das pessoas, tende a possibilitar bons resultados. Contudo, variáveis humanas, ou seja, características de personalidade podem ser fatores de extremo impacto e precisam, sempre que possível, ser controlados. E isso, infelizmente, não se dá apenas pela vontade, mas pela implantação de uma estrutura que possibilite tal controle.

Este texto faz referências aos psicólogos Abraham Maslow (1987) e Frederick Herzberg (1975).



Sérgio Moab Amorim de Albuquerque - CRP 08/08067-7
Psicólogo / Psicanalista / Servidor Público 
Especialista em Gestão Estratégica de Pessoas / Abordagem Psicanalítica / Sociologia Política 
Copyright © 2013 by SÉRGIO MOAB AMORIM DE ALBUQUERQUE All rights reserved

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A GESTÃO POR COMPETÊNCIAS E O BANQUETE PERVERSO


O flagelo do assédio moral na administração pública

A gestão por competências surge na administração pública para o aprimoramento de seus controles, seguindo a lógica da administração gerencial adotada pelo setor. Contudo, independentemente de todas as controvérsias que o tema da administração gerencial no setor público possa suscitar, trabalhar com competências aponta para a construção de um desenho de carreira, com todas as trilhas de desenvolvimento e aprimoramento profissional tão carente ao setor.

Não há como falar em gestão no setor público sem levar em consideração duas questões fundamentais: Poder de Decisão e Instrumentos de Gestão. Esses Instrumentos possibilitam a visibilidade aos ciclos de processos, e, portanto seu maior controle, assim como aos resultados alcançados, para uma análise mais apurada das necessidades de revisão do chamado ciclo PDCA.  Quanto ao Poder de decisão, enquanto condição da administração gerencial, e base do processo de gestão, ele está intimamente ligado a essa revisão do ciclo PDCA, e à possibilidade de planejamento e de ação e recomeço.

Mas, e a Gestão por Competências, o que tem a ver com tudo isso? Ora, a gestão por competências é exatamente um instrumento de gestão, não voltado a processos, mas voltado às pessoas. Ela, por suas características específicas, fundamenta as decisões em relação ao desenvolvimento profissional do servidor, evitando as decisões baseadas em “achismos” e, em certa medida, controlando o abuso de poder, tão peculiar às relações interpessoais mantidas em nossas Instituições.

De certa forma, a Gestão por Competências deveria ser, na implantação da administração gerencial no setor público, o primeiro instrumento de gestão a ser implantado. Isso possibilitaria, em uma análise comparativa com o setor agrário, a preparação do terreno para o plantio de uma nova cultura. Infelizmente, nem sempre isso é possível, por razões diversas, e às vezes colhem-se frutos não tão suculentos e de qualidade como se desejaria.

Muito bem! E esse tal Banquete Perverso, o que tem a ver com Gestão por Competências? A Gestão por Competências implica necessariamente na adoção de algumas premissas para sua execução, que na verdade são pilares sem os quais não se pode falar em gestão por competências. Dois desses pilares, e que se considera de extrema importância, são o perfil adequado e o mérito, que de certa forma se confundem, pois estão relacionados à capacidade para atuar em determinado processo de trabalho e assim gerar os resultados esperados.

Um grande dificultador para a adoção da gestão por competências no setor público é a rejeição, algumas vezes velada, outras bastante explícitas, da adoção do mérito para o setor. Isso se dá pela forma como se estrutura a administração pública, onde, ainda as relações de poder são extremamente verticalizadas, apesar de todo um discurso contrário, e onde a ingerência política se confunde e corrompe a cultura administrativa.

É exatamente essa estrutura corrompida, onde perfil e mérito são um quase tabu, que propicia os banquetes perversos em nossas Instituições. A estrutura de poder, baseada na confiança e no apadrinhamento, sem levar em consideração perfil e mérito, favorece a fixação de indivíduos perversos, e o desenvolvimento de ações criminosas, de martírio emocional, cuja função é alimentar esses seres, nutrindo-os de forma projetiva com o mal-estar do Outro. Eis o Banquete macrabo, que podem ser evidenciados em discursos, em colóquios, em grupos pequenos ou grandes, ou até mesmo em reuniões oficiais de trabalho. Essas incursões predatórias em locais de trabalho têm sido muito discutidas na atualidade, sendo nomeadas de assédio moral. Segundo Hirigoyen - 2011, “Embora o assédio no trabalho seja uma coisa tão antiga quanto o próprio trabalho, somente no começo desta década foi realmente identificado como fenômeno destruidor do ambiente de trabalho, não só diminuindo a produtividade como também favorecendo o absenteísmo, devido aos desgastes psicológicos que provoca.”.

O modus operandi do indivíduo perverso, no contexto de trabalho é diversificado, mas tem sempre o objetivo de nutrição, por meio do aniquilamento emocional do Outro. Segundo, Hirigoyen - 2011, “em um primeiro momento, as pessoas envolvidas, não querem mostrar-se ofendidas, e levam na bricadeira desavenças e maus-tratos. Em seguida esses ataques vão se multiplicando e a vítima é seguidamente acuada, posta em situação de inferioridade, submetida a manobras hostis e degradantes durante um período maior.” Por que os perversos lutam por lugares de poder? Exatamente, pelas facilidades de acesso à sua nutrição, o mal do Outro.  Seguindo esta lógica, pode-se entender o porquê da importância do exercício do poder constituído para esses indivíduos. Essas funções lhes dão poder hierárquico e um acesso fácil ao seu objetivo libidinal. Contudo, as estruturas perversas não apenas ocupam essas funções de mando na administração pública, mas se espalham por toda ela, devido à proteção que lhes é possibilitada pelo sistema, e não raramente se unem na busca pelo alimento precioso.

Faz-se necessário trazer alguns exemplos práticos, que sustentam e são evidências das reflexões acima: 



Caso 1 – A sanha pelo poder e a essência da necessidade predatória:

X finge compartilhar dos ideais e propósitos administrativos de seu superior, porém não perde a oportunidade de, em público, denegrir a imagem daquele perante os demais, com deboches e questionamentos acerca da validade de seus posicionamentos. Segundo Hirigoyen (2011), “por vezes, o assédio é suscitado por um sentimento de inveja em relação a alguém que tem alguma coisa que os demais não têm (beleza, juventude, riqueza, relações influentes). É também este o caso dos jovens portadores de vários diplomas que ocupam um posto em que têm como superior hierárquico alguém que não possui o mesmo nível de estudos.”.

Y ocupa uma posição de mando, e com o pretexto de vigilância, desmonta uma estrutura administrativa, sem discussão prévia com os componentes da equipe técnica, trazendo seus membros para perto de si. A partir disso, toda a organização daquela estrutura se desmonta, e alguns de seus membros são constantemente assediados. Segundo Hirigoyen (2011), “um perverso age tanto melhor em uma empresa quanto mais ela for desorganizada, mal-estruturada, “depressiva”. Basta-lhe encontrar a brecha e ele vai ampliá-la para realizar seu desejo de poder.”.

Caso 2 – A imolação do cordeiro para o banquete de Ades:

Y é sistematicamente questionada sobre sua decisão, vinculada ao seu conhecimento e desenvolvimento profissional, de reformular seus conceitos, métodos e técnicas de trabalho, para tanto é convidada a participar de reuniões, com diversas pessoas, nem sempre diretamente envolvidas em sua área técnica, onde é questionada sobre suas atividades, e pressionada a se explicar e delatar pessoas. Contudo, pouca chance de explicação lhe é fornecida, e mesmo se lhe é fornecida, nunca aquilo que diz é levado em consideração. Segundo Hirigoyen (2011), “frequentemente, o assédio se inicia quando uma vítima reage ao autoritarismo de um chefe, ou se recusa a deixar-se subjugar. É sua capacidade de resistir à autoridade, apesar das pressões, que a leva a tornar-se um alvo.”.

É solicitado a H, sem maiores explicações, que desenvolva uma apresentação para uma reunião. H, então, solicita ajuda de B, que também foi envolvido na tarefa, para juntos montarem o trabalho. H pensa no que fazer, de acordo com o contexto da reunião e descobre que seu tempo será diminuído. H havia pensado em fazer um pequeno debate sobre uma citação, mas não teve muito tempo para fazê-lo, devido a um alerta sobre o tempo. B não participa da reunião, por questões de trabalho, e relata para H que não havia planejado nada de propósito, para ver se H iria fazer alguma coisa. H fez o que pode naquela situação. Contudo, em outra oportunidade B então pergunta a H se estava ficando louca, pois uma pessoa havia dito que H falava coisas incompreensíveis, desconexas, o que o espantou bastante, já que não houve nenhum questionamento por falta de entendimento durante a reunião. Segundo Hirigoyen (2011), “quando o processo de assédio se estabelece, a vítima é estigmatizada: dizem que é de difícil convivência, que tem mau caráter, ou então que é louca.”.

Y, B, O e k participam de uma reunião, onde é apresentado um projeto de gestão de pessoas, fundamentado em pesquisas de campo, assim como em pesquisas bibliográficas. Na referida reunião, o trabalho é exposto, porém das 7 ações interligadas, apenas 2 são aceitas pela Direção. Durante a reunião há uma certo ar de desconfiança e algumas partes do material apresentado, sobretudo os termos técnicos ali contidos, é ridicularizado por T e U. Y, que já vem de um longo período de stress e frustrações, sai da reunião arrasada. No dia seguinte, Y é chamada para uma nova reunião, onde não é lhe apresentada nenhuma pauta. A reunião, com a participação de T, U e C, se dá, inicialmente, em um clima bastante amigável. Todos sentados em poltronas, e, de repente, T diz que não é ligada em tecnologia e pergunta a Y o que significa uma postagem sua em uma rede social que versava sobre a dificuldade de Gerir Pessoas. Y fica incrédula com aquilo e, calmamente, explica os motivos pelos quais fez tal postagem. Segundo Hirigoyen (2011), “a violência perversa surge nos momentos de crise, quando um indivíduo que tem defesas perversas não consegue assumir a responsabilidade de uma escolha difícil.”.

Caso 3 – Cérbero vigia, vocifera e avança:

Após um processo contínuo de desestabilização, M é constantemente ignorada, não importando o local ou situação. Segundo Hirigoyen (2011), ”A desqualificação consiste também em não olhar para alguém, não lhe dizer sequer bom-dia, falar da pessoa como de um objeto (não se fala com as coisas!)”.

Diante de um desconforto, e para tentar resolver um conflito, F diz a T que precisa conversar com M, e assim buscar uma solução para o conflito instalado entre eles. T parece entender aquela necessidade, embora não fique bem claro se o fará ou não. Todas as atitudes de T são de negação da existência de M, e quando questionado do porquê de não ter tentado resolver aquela situação, vocifera palavras de ódio e rancor. Segundo Hirigoyen (2011), “o agressor recusa-se a explicar sua atitude. Essa negação paralisa a vítima, que não pode se defender, o que possibilita a continuidade da agressão. Recusando-se a mencionar o conflito ou a discuti-lo, o agressor impede o debate que poderia levar a uma solução. No mecanismo da comunicação perversa, o que se busca fazer é impedir o Outro de pensar, de compreender, de reagir.”.

Ao tomar conhecimento de que U discordava de sua avaliação, O, em meio a uma multidão de pessoas, proclama e vocifera impropérios sobre U, denegrindo sua imagem, duvidando de sua honra e competência, diminuindo sua contribuição profissional, e invocando o desejo de afastá-lo de suas atribuições. Segundo Hirigoyen (2011), “o peso de certas administrações, ou de empresas excessivamente hierarquizadas, permite a alguns indivíduos sequiosos de poder encarniçar-se contra outros indivíduos com total impunidade.”.

Caso 4 – A hipocrisia domina:

A tenta fazer seu trabalho de orientação juntamente com O, pelo qual foi convidada, Contudo M, ao saber da orientação, solicita explicações de A, a respeito da metodologia por ela usada, e critica a Unidade por orientar as pessoas em relação aos seus direitos. M vocifera finalmente que os direitos só devem ser esclarecidos quando descobertos pelas pessoas. Segundo Hirigoyen (2011), “toda originalidade ou iniciativa pessoal perturba. Cassam-se os élans e as motivações recusando-se toda responsabilidade e toda formação.”, e ainda, “há uma desvalorização da pessoa e de seu know-how O indivíduo não conta. Sua história, sua dignidade, seu sofrimento estão importando muito pouco.”.

Caso 5 – O conluio predatório:

R informa a M e N que deverão, por ordens superioras, se fazerem presentes em uma reunião de trabalho. N pergunta qual seria a participação deles na referida reunião, ao que R responde que não questionou isso, que era uma ordem superiora. N então diz que R deveria ter perguntado para que todos pudessem se preparar para a tal reunião. Pois ficariam sentados sem função alguma na sala. R então olha para M e pergunta: Mas tem alguma coisa demais ficar sentado sem fazer nada M? Ao que M responde: Não vejo nada demais em ficar sentado sem fazer nada o dia inteiro! Segundo Hirigoyen (2011), “nos grupos que trabalham sob pressão, os conflitos nascem muito mais facilmente. As novas formas de trabalho, que visam fazer crescer o desempenho nas empresas, deixando de lado todos os elementos humanos, são geradoras de stress e criam, assim, as condições favoráveis à expressão da perversidade.”.

Caso 6 – A negação do Outro:

Aqui não se pode pensar em um indivíduo em particular, pois são elementos de cultura, extremamente utilizados como forma de maquiagem das próprias dificuldades e deficiências de muitos ou da própria organização. Em reunião da Direção Local da Instituição, onde está presente todo o corpo dirigente e outros servidores com funções técnicas, P, Q e R, discutem sobre o comportamento de diversos servidores, sempre fazendo chacotas e insinuações maldosas sobre seus estilos e maneiras de se portar. P sugere um determinado servidor para exercer uma determinada função, nesse momento R se refere ao servidor do seguinte modo: Como?! Aquele lá, aquele deficiente, com aquela mãozinha inútil, não deve ter nem o segundo grau. E cai na risada. Segundo Hirigoyen (2011), “a agressão não se dá abertamente, pois isso poderia permitir um revide; ela é praticada de maneira subjacente, na linha da comunicação não verbal: suspiros seguidos, erguer de ombros, olhares de desprezo, ou silêncios, subentendidos, alusões desestabilizantes ou malévolas, observações desabonadoras... Pode-se, assim, levantar progressivamente a dúvida sobre a competência profissional de um empregado, pondo em questão tudo que ele faz ou diz.”, e ainda, “Se a empresa é assim condescendente, a perversão gera a emulação entre indivíduos que não são propriamente perversos, mas que perdem seus referenciais e se deixam persuadir.”.

Caso 7 – Sem chance: aqui é o ades:

P é responsável por uma determinada tarefa e H recebe uma demanda sobre aquela tarefa e começa a dar andamento à ação, assumindo-a e realizando todo o processo até sua saída e conclusão. Dias depois, P relata a H que ela se trata de uma pessoa que se tornou inútil à Unidade, e que realmente desejava e pediu para que H fosse remanejada para outra Unidade. Segundo Hirigoyen (2011), “essas manobras nascem de colegas invejosos que, para sair de uma situação embaraçosa, acham mais fácil jogar o erro sobre o outro, ou de dirigentes que pensam estimular seus empregados criticando-os seguidamente e humilhando-os.”.

G é mal avaliado por seu trabalho, equivocadamente, por seu superior por estar desenvolvendo um trabalho para a sede da organização. G, evidentemente insatisfeito e se sentindo injustiçado, leva ao conhecimento de um superior técnico de N essa situação. O superior então entra em contato com N para explicar a importância do trabalho desenvolvido pela Central para a Organização. K solicita a G ajuda para uma atividade sua, e informa a N sua intenção, recebendo a orientação de que G está totalmente disponível para a atividade da Central e não pode exercer nenhuma outra atividade. A partir desse momento, G não é mais envolvido em nenhuma atividade, a não ser que solicite a seus pares. O que não precisaria acontecer em um ambiente profissional. Segundo, Hirigoyen (2011), “pôr em quarentena é algo muito mais gerador de estresse do que sobrecarregar de trabalho, e torna-se rapidamente um processo destruidor.”.

U participa, conforme solicitado, na parte da manhã, de uma reunião em sua organização e que se estenderia por mais dois períodos, juntamente com O e C. Na tarde do primeiro dia, ainda sem entender muito bem o papel deles na reunião, U pergunta a O se ele acha que realmente seria necessária a participação deles ali. O responde que acha que não, e que, na verdade, ninguém deveria participar daquela reunião. Os dois permanecem na Unidade e por volta de 16h50 daquela tarde, U informa a O que precisará ir até os correios resolver um assunto particular, por acreditar que aquela empresa encerrava o expediente às 17 horas. O diz que também acredita que aquela empresa fechava àquela hora e que estava tudo bem, sem problemas. Quando U retornou não havia mais ninguém na Unidade, ou na reunião da sala ao lado. No dia seguinte, U chega em cima da hora para a referida reunião e vai deixar sua mala na Unidade, quando o telefone toca e um servidor solicita ajuda para resolver um problema referente àquela área técnica. U, então, pensa que seria mais prudente buscar a solução para o problema urgente do servidor do que entrar para a reunião já iniciada. A certa altura, O deixa a reunião e vem para a Unidade. U lhe faz um questionamento para ajudá-lo a resolver o problema do servidor. O lhe informa um número de telefone e faz a seguinte colocação: U, eu vou lhe dizer uma coisa, mas não é para você responder ou dizer qualquer coisa, certo?! U, sem entender o que se passa, diz que tudo bem e ouve o seguinte: U, eu vou pedir para T tirar você daqui, pois sua postura está me incomodando. Não que eu seja responsável por isto aqui, mas você não ajuda em nada, você é um servidor autônomo, e a forma como você se comporta está realmente me incomodando. U, pego de surpresa, e já bastante estressado com o acúmulo de agressões em situações anteriores, tenta entender e retrucar o discurso de O, mas, fica indignado, se irrita, e sai para o almoço. Nesse momento, O dá um sorriso cínico e acrescenta: E ainda sai ofendido! Segundo Hirigoyen (2011), “um meio bastante hábil de desqualificar uma pessoa consiste em induzi-la a cometer uma falta não só para criticá-la ou rebaixá-la, mas também para que tenha uma má imagem de si mesma.”.




Há certa semelhança entre o comportamento perverso e a psicopatia, semelhança que se dá, sobretudo na forma como se portam para aqueles que não os conhece, ou não foram eleitos como fast-food, ou mesmo banquete. Mas, a parte a aparência de bons moços/moças, típica dos psicopatas, eles adoram estar em evidência, demonstram simpatia exagerada, são extremamente bajuladores e, em se tratando de administração pública, confundem política com politicagem. Assim, pode-se dizer que “o abuso de poder dos chefes sempre existiu, mas atualmente fica muitas vezes disfarçado. Os diretores falam de autonomia e espírito de iniciativa a seus empregados, mas só exigem deles submissão e obediência. Os assalariados produzem porque estão obcecados com as ameaças referentes à sobrevivência da empresa, ou pela ou pela perpectiva de perder o emprego, ou por estarem sendo continuamente chamados à atenção, ou seja, por sua eventual culpa.” Herigoyen (2011). 

É a partir disso, que podemos fazer duas afirmativas: A Gestão por Competências tem grande possibilidade de administrar essa questão, de extrema gravidade para a saúde física e mental dos servidores públicos, a partir da elaboração e definição dos perfis competentes adequados, e da implementação do mérito para a ocupação de cargos de mando e para a gestão dos processos de trabalho.  Além disso, é a possibilidade concreta da organização construir um desenho de carreira para seus servidores e realizar, a partir da construção de indicadores de desempenho, uma verdadeira e coerente avaliação de desempenho. A segunda afirmativa é que a Gestão por Competências, utilizada como ferramenta de desenvolvimento, é um entrave para a cultura organizacional vigente, e para o bem-estar do ninho perverso, - Aqui me recordo de uma cena do filme Alien – O Oitavo Passageiro! -, no qual se transformou a Administração Pública. Para finalizar, e ainda Segundo Hirigoyen (2011), “a empresa torna-se vítima dos indivíduos que a dirigem. Ela é vampirizada por predadores cuja única preocupação é manter-se em um sistema que o valoriza.”. Talvez, por conta disso, e sendo esse um grande fator dificultador, a implantação da Gestão por Competências na Administração Pública, tenha avançado tão pouco desde a sua determinação, pela promulgação do Decreto n° 5.707/2006. E, ela só terá valor real para o servidor se desenhar uma carreira profissional, caso contrário pode ser apenas mais um instrumento de tortura e seviciamento nas mãos de predadores perversos.


Sérgio Moab Amorim de Albuquerque - CRP 08/08067-7
Psicólogo / Psicanalista / Servidor Público
Especialista em Gestão Estratégica de Pessoas / Abordagem Psicanalítica / Sociologia Política
Este texto possui citações do livro Assédio Moral – A Violência Perversa no Cotidiano, do original “Le Harcèlement Moral”, da psicanalista francesa Marie-France Hirigoyen.

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