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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

PENSANDO DIREITOS HUMANOS


A PARTIR DO 2º CICLO DE CINEMA E DIREITOS HUMANOS


Sobre o filme “Quando meus pais saíram de férias”.
Um excelente filme nacional que versa sobre um período tenebroso de nossa história, o período da ditadura militar. O diretor do filme trouxe para a tela, de forma magistral, pelo menos para mim, aquela mesma sensação de aparente calmaria que, os que não estavam diretamente envolvidos no conflito sentiam, enquanto vigorava a violência nos bastidores da vida nacional.
Na atualidade de nosso país, após o advento de mais um golpe de Estado instalado em território nacional, parece extremamente pertinente abordar sobre o regime de exceção instalado naquela época, já que o recrudescimento deste golpe pode nos arrastar a um novo período de grande violência. E isso já se faz sentir em eventos que pipocam aqui e acolá.

Sobre o filme "El Patrón", que versou sobre a escravidão moderna, pela ausência da proteção da Instituição do Direito na relação capital x trabalho.
Todos os elementos do trabalho escravo moderno estão presentes no filme, como a falta de um contrato formal, o confisco de documentação, o alojamento precário e inadequado, as agressões e o assédio moral, e as promessas que nunca são cumpridas.
No debate, que se seguiu à exibição do filme, entre as questões que chamaram a atenção, uma delas foi crucial para chegarmos à raiz, mais além das questões acima mencionadas, e diz respeito à forma de enfrentamento da situação. A pergunta nos depara com o perfil e a personalidade dos personagens, e nos indaga o porquê da manutenção daquela relação, aparentemente tão desfavorável para a parte mais fraca. Evidentemente, pode-se perceber que as condições impostas pelo contexto social e materiais que envolviam a vida do sujeito o obrigaram a se manter na situação desfavorável. Contudo, após o trágico desfecho, o personagem trabalhador retoma sua vida anterior, da qual pretendia escapar. E aqui nos vem imediatamente um questionamento do porquê não fez antes da tragédia anunciada.
A resposta a essa questão pode estar contida na despedida das dias famílias, e na pergunta efetuada pela mulher do advogado ao marido: “você percebeu que ele começou a te tratar como patrão?!” Mais ou menos isso. Ora neste caso, como em qualquer relação humana, uma espécie de sedução, onde o sujeito subserviente se oferece ao outro em sacrifício. A relação vingará, desde que o outro aceite a proposta mórbida, exatamente como aconteceu na relação com o Patrón. Constrói-se assim uma relação simbiótica, onde um é complemento do outro, respondendo a um desejo mórbido com desfecho previsto.
Essa situação nos leva a pensar no par clássico da psicanálise, a união sado-masoquista, onde um goza pela pele, no real, e o outro pelo olho, no imaginário. O desfecho nos traz a dimensão real e simbólica da tragédia, onde ambos sofrerão as consequências daquela simbiose mórbida, embora é possível afirmar que o o sádico, se pensarmos a vida como um bem precioso, foi quem mais perdeu, embora tenha conseguido chegar ao gozo supremo, qual seja a própria morte.
Mas, pensando na civilização, e a necessidade de manutenção da própria vida para sua preservação, voltamos à pergunta da audiência sobre qual a solução. E é a civilização e sua cultura que nos traz a resposta, pois a solução está na preservação, na manutenção, no aprimoramento e na defesa da instituição do direito e das Leis protetivas da pessoa e dos direitos humanos, por meio de um estado forte e interventor, com Leis trabalhistas protetivas, que deem conta da preservação do homem, este incorrigível predador, inclusive de si mesmo.

Sobre o filme "Terra Vermelha", de 2008.
Uma produção italiana que mostra, em diversos aspectos, a luta dos povos originais da terra nomeada Brasil pelos invasores portugueses para recuperar suas origens, sua dignidade e espaço na terra confiscada pelos invasores. O filme é riquíssimo nos detalhes de uma luta desigual e desumana, onde muitas vezes, a solução encontrada pela nação Kaiwá, para o conflito interno intrapsíquico que se instala em cada indivíduo, é vista no suicídio.
A parte central e mais emblemática do filme é quando o fazendeiro, acompanhado de um procurador de justiça, encara o chefe do clã que reivindica a terra de seus ancestrais, pega um punhado de terra e fala da presença na terra desde os seus avós. O chefe Kaiwá também pega um punhado de terra e a come, numa clara mensal ao pertencimento à terra e sua ancestralidade. Nesse momento, não há palavras a serem ditas.
No debate, a questão principal foi sobre o que fazer para resolver a questão desse martírio de 500 anos e o genocídio que se segue nos dias atuais. A terra foi invadida e está ocupada, hoje somos todxs filhos dessa terra, povos originais e descendentes desses e dos invasores. Portanto, a solução humana e possível é o respeito e a inclusão, e a reverência que precisamos fazer à nossa ancestralidade diversa. Os povos originais são nossos ancestrais tanto quanto os invasores portugueses e os migrantes que coloriram nossa nação, merecem respeito, reverência e temos muito a aprender mutuamente para, de fato, construirmos uma nação mais humana e inclusiva.

Sobre o filme "Linha de Passe", de Walter Salles e Daniela Thomas.
O filme versa sobre o dia a dia de sobrevivência de uma trabalhadora doméstica, grávida, e seus quatro filhos, jogando com o destino em meio à enorme desigualdade e exclusão, promovida por um sistema que, a cada nova jogada, aumenta o fosso social em um país com imensas riquezas.
A cada momento da trama é possível perceber o flerte dos personagens, empurrados pelo sistema, para a delinquência e a criminalidade, sustentados pela falta e injustiça social.
Um filme para refletir sobre o nosso papel como cidadãos diante da injustiça e da miséria, vetor incontestável para a delinquência e o crime.

Sobre o o filme "Quase Dois Irmãos".
Na obra, onde a trama se desenvolve em três períodos de nossa história, Antes do Golpe de '64, durante a Ditadura Militar e no dias atuais, dois personagens vivenciam a profunda desigualdade e o apartheid racial no Brasil de todos os tempos.
A trama, que conta a história do surgimento do Comando Vermelho na cidade do Rio de Janeiro, nos traz o momento de encontro daqueles que iniciaram essa organização criminosa com aqueles que lutavam por uma sociedade mais justa e contra a ditadura militar. Sugere-se que esse encontro, ocasionado pela não discriminação, por parte do governo militar, para o enquadramento na chamada Lei de Segurança Nacional, trouxe uma série de elementos da organização da resistência à ditadura para a organização criminosa.
O debate que se seguiu foi extremamente fecundo, conduzido pela doutora Camila Caldeira Nunes Dias, e nos trouxe, além da visão da guerra civil que se trava em nosso país, a grande pergunta de como enfrentar a questão da criminalidade e a enorme desigualdade e apartheid social que a gera.
A meu ver, a única solução para a questão das drogas, retratada no filme, é a assimilação do comércio pelo mercado, ou seja a legalização do uso e comercialização, com controle do Estado, e um grande investimento em saúde pública. Além disso, o combate à desigualdade é condição sine qua non para o combate e controle da criminalidade, de forma geral. Qualquer outra possível solução é apenas discurso vazio, e que tende a favorecer unicamente à elite que lucra com o tráfico e a sua ilegalidade, e a aumentar as estatísticas de mortes e a violência que, de forma esmagadora e absoluta, atinge, principalmente, as classes menos favorecidas.

Sobre o filme "Narradores de Javé".
Uma produção de 2005 que, com um leve toque de humor, traz reflexões importantes sobre direito à Memória e relações sociais e econômicas no mundo do sistema capitalista.
A história trata do conflito disseminado no seio de um povoado pobre, onde seus integrantes são todos analfabetos, às voltas com a invasão do sistema econômico que, para suas realizações capitalistas, precisa inundar a área onde foi edificado o povoado.
Os habitantes tentam reconstruir e registrar sua história como forma de defesa em relação a invasão, contudo o poder econômico é absoluto, e a ingenuidade e a fragilidade pueril dos membros da comunidade não permitiram o enfrentamento com tamanha força destrutiva.
A meu ver, o único membro do povoado que esboça uma certa capacidade de enfrentamento, e porque sua história o fez "perder o medo", é o personagem que atira nos engenheiros da empresa, mas logo é contido pelos demais moradores, seguidores servis de um mito redentor.
De qualquer forma, é importante lembrar a importância da Memória para se evitar tragédias humanas ocorridas na civilização que, sem essa memória, tem o potencial de se repetir com mais facilidade. Um exemplo clássico na história é o holocausto judeu durante a segunda guerra mundial, cuja memória tenta abafar as diversas tentativas espalhadas na civilização de reacender o que foi o nazifascismo para a humanidade

Sérgio Moab Amorim de Albuquerque - CRP 08/08067-7
Psicólogo / Psicanalista / Servidor Público
Formação em Gestão Estratégica de Pessoas / Abordagem Psicanalítica / Sociologia Política
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