A partir do 1º Ciclo de Cinema e Direitos Humanos
O
filme Negação, do diretor Mick Jackson, de 2016, o primeiro do Ciclo, e que versa sobre
liberdade de expressão, aprofunda a discussão sobre a liberdade do
indivíduo expressar suas opiniões, e traz uma reflexão importante
sobre a sustentação da verdade, fundamentada ou não em provas.
Poderíamos então nos perguntar, a partir da proposta do filme, o
que seria, de fato, a verdade, sem uma prova que a sustente?! Uma
verdade sem sustentação probatória escapa inexoravelmente ao campo
da verdade, passando a vigorar no campo da fé.
A
trama gira em torno de um processo aberto por um suposto historiador,
que, de forma leviana, sem provas e movido por sua paixão pelo
nacional socialismo alemão, nega a existência do holocausto, contra
uma jornalista que o denuncia em seu livro. À medida em que se
desenrola a trama, percebe-se a atualidade dos fatos levantados e a
relação com os eventos vividos no Brasil e no mundo, na atualidade
globalizada.
No
Brasil dos últimos tempos, vivemos em um mundo anacrônico e
desconectado da relaidade tangível, com a instauração de processos
kafkianos de viés político patrocinados pela Justiça, e tentativas
de encobrimento dos crimes e dos criminosos que vicejaram durante o
período da ditadura militar entre '64 e '85.
Na
esteira dessa profunda negação da verdade, presenciamos o nascer de
processos sociais que buscam relativizar as desumanidades, praticadas
ao longo de nossa história, passada e recente, promovidas contra
grupos étnicos específicos de concidadãos, e uma perseguição
implacável a indivíduos com orientação sexual diversa da norma em
nosso meio. Neste país, definitivamente contaminado por um
fundamentalismo pentecostal, sustentado por um pensamento conservador
de ultra direita, vivemos uma situação de negação absoluta da
intelectualidade, do pensamento crítico, das luzes, e da verdade
empiricamente fundamentada.
No
momento em que vivemos um processo generalizado de disseminação de
fake news, com profunda interferência nos processos democráticos, e
tentativas de revisão de diversos fatos históricos, com o objetivo
de encobrir graves crimes contra a humanidade, o filme parece
bastante atual, e de grande relevância para o pensar dos rumos que
tomaremos daqui para frente em nossa conturbada civilização.
O
segundo filme apresentado no 1º Ciclo de Cinema e Direitos Humanos,
As Sufragistas, de 2015, da diretora Sarah Gavron, trata do movimento
de mulheres na Inglaterra nos momentos iniciais do século XX, pelo
direito ao voto.
No
desenrolar da trama, que gira em torno do gradativo envolvimento da
personagem Maud, é possível perceber a condição da mulher naquela
época, sem direitos, sem voz e completamente subserviente ao homem,
seja em casa, onde exerce uma segunda jornada de trabalho e não tem
direito legal sobre os filhos, ou no trabalho, com salários menores
que os dos homens, jornada bem maior e muito mais exaustiva e assédio
de todos os tipos.
O
acesso ao direito do voto, como claramente propõe a personagem
principal em uma de suas falas, é a possibilidade de, pelo voto,
mudar a Lei, favorecendo a busca de igualdade de direitos entre os
gêneros, em uma sociedade naturalmente machista e excludente. Aliás,
uma situação que, apesar de alguns avanços dos direitos humanos,
permanece inalterada em algumas sociedades dos dias atuais. E
mesmo onde há avanços, há uma constante disputa e convivência
morna com o machismo e o patriarcado.
Algo
que fica evidente no filme é que, apesar da luta empedernida das
mulheres pelo direito ao voto, a cultura machista da época, e a
desonestidade que alimenta a política, são um entrave ao sucesso de
suas reivindicações. Apenas quando há um suicídio diante do
mundo, em um evento onde participa o próprio rei, as coisas começam
a mudar e, gradativamente, a luta se espalha por outras nações, com
consequente vitória das mulheres.
Nos
dias atuais, quando há um avanço de forças conservadoras em todo o
Globo, com a vitória da extrema direita em alguns países, inclusive
no Brasil, essa é um discussão necessária e extremamente
importante. No Brasil a extrema direita ascendeu ao poder, pelo voto,
com um discurso violento, racista, homofóbico e misógino. Acende-se
assim um grande alerta da importância da discussão de temas como
este, que balizam em todo o sempre a questão da democracia e do
exercício da cidadania.
O
terceiro e último filme apresentado no
1º
Ciclo de Cinema e Direitos Humanos, Milk,
do diretor Gus
Van San,
trata
dos problema enfrentados pelas pessoas LGBTs, e a busca por Direitos
que garantam a sua existência como pessoa e cidadãos. Ele narra a
trajetória do ativista Milk, que ascende em suas ações pelos
direitos da comunidade LGBT, tornando-se o
primeiro homossexual assumido eleito para um cargo público na
California. Milk é assassinado por sua defesa dos direitos LGBT.
O
filme
mostra o nascimento de um espaço de expressão que, pouco a pouco,
entra em choque com forças retrógradas, numa formação de reação
contra a liberdade de expressão e o direito à existência de um
determinado segmento social. É exatamente um filme para pensar o
direito de ser em uma sociedade, plural em sua essência, mas que
insiste em esconder essa pluralidade.
A
homossexualidade é uma característica humana, muitas vezes também
encontrada nos animais não pensantes, e que pode ser observada na
civilização, em formas de expressão diversas, ao longo da história
da humanidade.
O
processo repressivo observado e combatido na modernidade, tem suas
raízes no advento da igreja católica, apostólica e romana, e na
idade média. Parece
que o paganismo, até por conta da pluralidade de deuses que
ostenta em
seu Panthéon, era perfeitamente tolerante com a pluralidade de
expressões do desejo humano. O monoteísmo transformou essa visão
plural, típica da visão politeista, em
uma visão monocular que vê o mundo e sua pluralidade natural de
forma míope, algo
estranho a ser combatido.
A
idade
das luzes trouxe uma abertura, pela via da ciência, para uma nova
visão, em contraponto ao obscurantismo da igreja católica e da
idade média. A
partir do século XIX, e ao
longo do século XX, as
luzes buscaram clarear e entender a alma humana, e
muitas lutas foram travadas pela afirmação de direitos de diversos
segmentos, destituídos, e muitas vezes alijados, de seus direitos
civis e de cidadania.
Sérgio Moab Amorim de Albuquerque - CRP 08/08067-7
Psicólogo / Psicanalista / Servidor Público
Formação em Gestão Estratégica de Pessoas / Abordagem Psicanalítica / Sociologia Política
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