Urge,
em tempos tão sombrios, a perda total e absoluta do medo para o
enfrentamento do opressor. Essa lição nos é dada por uma
personagem do filme Narradores de Javé, que enfrenta os engenheiros
de uma empreiteira que tem como objetivo inundar o povoado de Javé,
transformado-o em um lago para uma usina hidroelétrica, sepultando assim
sua história sob as águas do "progresso".
O
caráter simplório e servil do povo brasileiro está muito bem
retratado naqueles que, na cidade, tentam conter o único habitante
que ousa enfrentar o algóz, exatamente por ter perdido o medo. E
essa personagem perdeu o medo por ter experienciado a
invasão, a agressão e a morte de seu genitor dentro da própria
casa. E, não por coincidência, há algo de similar que nos une a
Javé, e que se passa no Brasil de hoje.
As
atrocidades que o Golpe de 2016 tem promovido no país, e a falta de
resposta à altura do povo, nos dá a dimensão exata deste medo
subserviente e servil que acomete toda a população. Os maiores
absurdos contra o povo e a nação estão sendo cometidos sem que uma
resposta mais contundente seja proferida contra os serviçais do
capital internacional e da destruição do Brasil e dos brasileiros.
A desconstrução do bem-estar social, com os ataques à saúde, à
assistência, à previdência, e à educação públicas carecem de
uma resposta dura por parte do povo que, sem essas políticas,
perecerão na indigência, em uma sociedade cada vez mais desigual.
Concomitantemente
à destruição do estado, que tem em sua arquitetura a estratégia
do congelamento dos gastos por vinte anos, o patrimônio público e a
soberania nacional são entregues ao capital internacional, com a
desculpa mentirosa da incapacidade do estado de gerir o patrimônio
público. Durante muito tempo foi assim! Maus brasileiros, que
apostam na pouca capacidade de discernimento
de alguns e na ingenuidade manipulada de uns tantos outros, usurpam o
patrimônio do povo em troca de enriquecimento pessoal.
E
esses arautos da miséria apostam no medo do povo, disseminando a
ideia de uma nação ordeira e pacífica, em detrimento de uma
realidade cada vez mais destrutiva e promotora de um fosso social
inimaginável. E muito do patrimônio do povo e da nação já se foi
nas águas do Golpe, como a Embraer, o Pré-sal, a Base de Alcântara,
os Direitos Trabalhistas, o Ciências sem Fronteiras, o Orçamento
Reajustado, o Controle dos Agrotóxicos, a Farmácia Popular, o Fundo
Soberano e a própria Democracia.
Na
verdade, somos um povo mantido a chicote desde sempre, que tem na
autoridade opressora, e no poder altamente verticalizado, sua
estrutura de dominação opressiva. A história do Brasil é uma
história de opressão e imbecilização de sua gente. A experiência
de mais de trezentos anos de escravidão, as diversas tentativas de
controle da liberdade dos corpos indígenas que jamais assimilou a
cultura invasora, os sucessivos golpes perpetrados pelo poder
econômico e a perpetuação do status de colônia no imaginário,
forjaram uma situação de apartheid entre a massa do povo e o
estado, ou entre esse imagiário construído e a realidade. A falta
de identificação com a própria nação e o medo desmedido são os
maiores inimigos da liberadade e da própria existência.
A
quadrilha que assumiu o país desde então (Golpe de 2016)
desconstrói o país a cada nova cartada, a cada nova investida,
protegida por um poder judiciário comprometido até a tampa com essa
arquitetura da destruição. A maior prova desse envolvimento está
tipificada nos últimos acontecimentos, manobras notadamente ilegais
que, subvertendo a instituição do direito, expoem cada vez mais as
víceras do conluio golpista.
Só
a perda absoluta do medo, medo do pai-patrão, medo da autoridade
despótica, medo da polícia repressiva e até mesmo o medo de deus,
estruturas forjadas para o controle do corpo e da alma, poderia
libertar o ser cidadão/brasileiro para sua autoafirmação e a
libertação desse controle opressivo. O povo brasileiro carece dessa
autoafirmação, desse empoderamento enquanto pessoa e cidadão, como
o indivíduo dentro do processo analítico, para passar a ser agente
de seu meio, na defesa de seu espaço e de seu território.
Sérgio Moab Amorim de Albuquerque - CRP 08/08067-7
Psicólogo / Psicanalista / Servidor Público
Formação em Gestão Estratégica de Pessoas / Abordagem Psicanalítica / Sociologia Política
Copyright © 2018 by SÉRGIO MOAB AMORIM DE ALBUQUERQUE All rights reserved
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